sexta-feira, 28 de janeiro de 2011

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Por Viveca Santana


O acaso era uma das coisas comuns no dia a dia dela, surgia em visitas violentas e sem avisar, escondia-se em momentos de preguiça e reaparecia com sua vontade de desorganizar tudo.
Já havia se acostumado com as surpresas que a vida pregava e algumas vezes, diante das repetições, já sentia os acontecimentos, com uma predestinação ou um convite à visão que algumas vezes não queria ter. Finalmente algo acontecia de diferente e desde o início ela sentia os sinais, mas alternava os caminhos, fugindo da encruzilhada que o destino impunha como resposta à direção correta que se deve tomar e seguir em frente. Às vezes tomava o rumo de descampados, os caminhos mais longos, íngremes, difíceis e cheios de espinhos, para evitar a normalidade das coisas e acreditando evitar lágrimas, sim, como se pudesse.
À sua maneira, fugia dos encontros com o sofrimento, cerrando o seu coração com um cadeado sem chave, impondo suas vontades, traçando seus caminhos numa independência dolorida e criando histórias para parecer que as rédeas da vida estavam em suas mãos.
Aí o acaso aparecia, e com os pés molhados, destruía seu castelo de areia e a obrigava a recomeçar outro castelo, outro sonho, outra história, como se tudo tivesse uma frivolidade infinita, como se tudo fosse muito fácil reconstruir.
Só que dessa vez o acaso veio e a empurrou forte enquanto estava em êxtase e atida em coisas novas. Tornou a vida dela uma grande piada, um encontro que atravessou às cegas um mar infinito e acabou num lugar que ela já conhecia sem nunca ter ido, com uma pessoa que nunca tinha visto de perto, mas sabia que existia por ali.
Era como se a vida dela fosse metaforizada em um quebra-cabeças, uma colcha de retalhos, que alguns pedaços ela tinha perdido por aí ou tomaram dela e agora ela retomava o direito de encontrar aos poucos, juntando com dificuldade, o que a vida teimava em mostrar e ela na sua cegueira não enxergava.
Agradecia ao acaso por agredi-la tão docemente e ter mudado sua história.